sábado, 16 de fevereiro de 2013

Cidade morta

Desde 2009 essa fúnebre cidade me persegue, com o seu calor mórbido, suas pessoas frias e desumanas que só se importam com o poder monetário que você carrega. Vim para Brasília com dezessete anos e desde o primeiro momento em que eu soube que viria morar aqui, o pesadelo começou. Um lugar que eu mal conhecia alguém, que tinha uma arquitetura horripilantemente moderna e um calor desgraçado junto com a secura maquiavélica, era o primeiro passo para a minha morte interior.
Abdicar de todas as minhas lembranças de Belo Horizonte, todo o meu amor pela cidade, pelos parques e praças, tão lindas, cheias de histórias de domingo. Da alegria e humildade das pessoas ao te cumprimentarem no ponto de ônibus, dar bom dia ao trocador, ver a cidade cheia de gente indo trabalhar, sem aquela formalidade e preconceito. Todos juntos, todos diferentes, com vidas e cotidianos distintos. As lanchonetes simples e baratas do centro da cidade, daquelas que você paga um real por quatro pães de queijo e um pingado, e é uma delícia. Eu morro de saudade disso. De ir à Praça da Liberdade aos domingos e ver as crianças brincando com os pais, andando de velotrol, aprendendo a andar de bicicleta sem uma rodinha, esperando na fila para poder beber água da fonte... O moço do algodão doce e os hippies vendendo coisas artesanais. Novamente, todo mundo junto. Normal estar todo mundo junto, não? Aqui em Brasília não. As pessoas, desde que moro aqui, percebi a frieza e a falta de hospitalidade presente nessa cidade, a falta da palavra "família" em si, a humildade, simplicidade... Isso é tão estranho aqui, tão estranho e inexistente. Aqui é desumano. Aqui não tem amor, não tem vida, te sugam a vida que você tinha antes de vir pra cá. Te tomam o amor e pureza que você esbanjava tanto antes de morar aqui. Brasília engessa.
Fazer amigos em Brasília é tão difícil quanto ganhar na loteria sem apostar. Sempre tive boas amizades, daquelas de você ir na casa da outra, fazer um bolo, brigadeiro, esquentar o café e assistir a novela das seis. Fazer festa do pijama, alugar um tanto de filme e todo mundo assistir junto. Sair pra beber na Praça da Liberdade até de madrugada e ficar esperando o ônibus passar às 6h da manhã. Pra mim, isso vale muito mais do que todas as amizades que já tive em Brasília. Aqui, se você não sai com a pessoa pra festa, você já não é mais amigo. Não existe amizade, existe interesse. Ônibus? Você anda de ônibus? Mas credo, que nojo, odeio ônibus, ônibus é coisa de pobre. Eu pego ônibus desde que me entendo por gente, desde os meus dez anos de idade, e não sou pobre, e mesmo se fosse, não sei que diferença faria.
Não tem muito o que se fazer aqui, se você é uma pessoa caseira, te taxam de chata, depressiva, caxias. E aí, acaba que não te resta muita opção de lazer. Cinema certamente uma hora você vai acabar vendo todos de todos os cinemas, Feira do Paraguay (é uma feira de produtos importados, mentira, contrabandeados que vende tudo quanto é coisa, mas prefiro comprar pelo ebay) que uma hora enche o saco, principalmente depois de 4 anos, Parque da Cidade (que não tem porcaria nenhuma pra se fazer, além dos casais que não moram sozinho e vão lá para dar amassos, um parque sitiado por abelhas, um parque de diversões caríssimo e de uma estrutura extremamente insalubre e um perigo durante a noite). Não tem ônibus a noite, não tem um parque que as pessoas possam se encontram a noite sem medo de ser esquartejada ou assaltada, e também se alguém for beber, não tem como voltar pra casa, porque não existe ônibus a noite, não existe! Acaba que você querer fazer um programa romântico com o seu namorado se torna impossível, a não ser que você vá para o Pontão, que é longe de tudo e resolva tomar um vinho, e que quando estiver voltando pra casa, que também é longe, pare em uma blitz e tenha o carro apreendido. É tudo tão fora de mão, tão impossível de ser feliz. Olha, se você é podre de dinheiro, eu entendo que você se divirta aqui. Mas eu não sou, e não vejo porque o fato de'u ser mais rica me faria feliz. Sempre tive a mesma situação financeira em Belo Horizonte e fui feliz demais. O problema não sou eu, é essa merda de cidade.
Onde já se viu pessoas não cumprimentarem as outras? Uma vez fui dar bom dia para o motorista do ônibus e ele me olhou torto. Eu fiquei sem entender aquela atitude. Será que eu fiz algo errado? Mas isso sempre foi normal para mim...
Roupa. Ah, roupa... Roupa é um ótimo assunto nessa cidade. Não tem lojas! Loja só em Shopping, e é tudo caro. Quer comprar uma blusa normal? Só nas lojas de departamento... E se você não se veste bem, vão te olhar feio, muito feio, e vão te esnobar e te excluir. Igual Jardim de Infância. As pessoas daqui estagnaram no Jardim de Infância e acham isso super normal.  Aqui não existe aquelas lojinhas gostosas e baratas do centro da cidade, que você compra sapatilha por vinte reais, blusinhas regatas por dez reais e bijuterias a preço de banana... Aqui o negócio é caro e injusto.
Sem falar no aluguel sem noção. Tem gente que paga NOVECENTOS reais para morar em uma kitinete de VINTE metros quadrados, e se quiser comprá-la, custa em média, uns 250 mil reais. Eu tenho vontade de mandar tomar naquele lugar, mas não adianta. Com 250 mil reais eu compraria um apartamento todo arrumadinho no Serra ou em algum bairro bom de Belo Horizonte, e ainda sobraria dinheiro para uma pintura nova e se bobear uma entrada num carro. É inadmissível o valor que eles cobram para uma pessoa morar, uma qualidade de vida de merda, um apartamento que você nem tem onde pendurar as roupas limpas, mesmo porque nem máquina de lavar cabe. Eu não sei qual a patologia dessa cidade, talvez a demência em si, mas o que mais me convence é a sociopatia. A pessoa vem morar aqui bem normal, mas acaba ficando desnorteada com as condições, e isso pega. Se você quer ter ódio pela vida, venha para Brasília, aqui é o lugar.
E olha, sinceramente, nunca fui tão infeliz desde que me mudei. Eu costumava ser uma pessoa mais viva, extrovertida e feliz com a vida, hoje sou mais amarga e cada vez mais triste. Gosto de chamar aqui de "Detrito Federal".
E olha, pouco me importa se você idolatra e defende aqui, neste caso a sua opinião é insignificante.